Contextualizando: fim de dia, pai fora, a acabar de arrumar a cozinha, com pressa para as ir deitar.
Quando estou quase a terminar, ouço a mais a nova chamar, o som é abafado: "Mamã, anda cá. Não consigo sair".
Estava no escritório. A porta não abre. Pergunto-lhe o que se passa. "Fechei a porta à chave". Ó Céus! "Tenta rodar a chave, Beatriz", "Não consigo" , a choramingar. Noto-a a ficar nervosa e a afastar-se da porta. A irmã entra em modo histerismo, fala mais alto que eu, uma grande confusão, ninguém se ouve. Tive de acalmar a mais velha e não a deixar falar. Experimentei outras chaves. Nada. Estudei a possibilidade de sair sem ser pela porta. Impossível. Comecei a ficar sem opções. Deitar abaixo a porta (tipo à filme) fora de hipóteses, nunca teria força para isso. A miúda sempre a pedir para abrir a porta. A choramingar. O medo a crescer.
Dou um estalo mental a mim mesma. Não pode ser, calma lá. Isto resolve-se. A única solução é ser ela abrir a porta.
"Beatriz, chega aqui perto da porta. Tem calma. Vamos abrir a porta as duas. Está bem?"
"Não consigo"
"Consegues! Roda lá a chave como fizeste para fechar"
"Eu não sei. Para que lado é?"
"Faz para qualquer lado e vamos ver"
Roda a chave e nada. "Não consigo. Eu não sei" E chora.
"Tenta outra vez, tens de fazer força. Tem calma e tenta. Vais ver que dá"
Volta a tentar e ouve-se um clique. Puxo a maçaneta. Nada. Foi no sentido contrário. "Boa, filha! Tens de fazer o mesmo mas roda a chave para o outro lado. Faz força para rodar"
Ela roda e roda. E chora nos entretantos, diz que não consegue e afasta-se da porta. Chamo-a e tenho de a acalmar, via fechadura, várias vezes. "Espreita aqui, vês a mãe? Não vou sair daqui. Vamos lá tentar!"
Mais umas quantas tentativas... abriu!
Ufa! A porta abre e ela atira-se para o meu colo. Coração a miil e olhos vermelhos. Super assustada. A irmã ou se ri histérica ou faz uma cara de pesar, Ó Bia!
Foi uma lição para todos! A Inês tirou todas as chaves das portas (já poucas tinham, só as que nunca se fecham mesmo, como a do escritório em que a porta está sempre aberta). A Beatriz prometeu nunca mais brincar com chaves, Eu, depois de as pernas pararem de tremer, pensei que ainda acabamos por ter sorte. A Inês já fazia filmes de chamar bombeiros e polícia!